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66º Encontro 13/8/22 7ª Admoestação Que a boa operação siga a ciência - 2ª parte - Mortos pela...

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    Frei
  • 15 de ago. de 2022
  • 10 min de leitura


QUE A BOA OPERAÇÃO SIGA A CIÊNCIA


Depois de termos analisado o significado do título dessa Admoestação, neste encontro vamos nos deter ao texto propriamente dito. Vejamos novamente o texto:



Que a boa operação siga a ciência


Diz o Apóstolo: A letra mata, mas o espírito vivifica. São mortos pela letra os que cobiçam saber só as palavras, a fim de serem tidos mais sábios entre os outros e poderem adquirir grandes riquezas, para dá-las aos parentes e amigos. E são mortos pela letra aqueles religiosos que não querem seguir o espírito da letra divina, mas só cobiçam saber mais palavras e interpretá-las para os outros. E são vivificados pelo espírito da letra divina os que não atribuem a si toda a letra que sabem e cobiçam saber. Mas, pela palavra e pelo exemplo, devolvem-na ao altíssimo Senhor Deus, de quem é todo o bem.



2ª. Parte: MORTOS PELA LETRA E VIVIFICADOS PELO ESPÍRITO



1. Como São Paulo também Francisco é fruto da ação do Espírito


A frase com a qual Francisco abre a 7ª Admoestação é tirada da segunda Carta de Paulo aos Coríntios. No contexto, Paulo sofria contendas por parte de alguns judeus tradicionalistas porque pregava sem nenhuma carta de recomendação por parte das autoridades religiosas de Jerusalém. Paulo, então, responde que ele não precisa de nenhuma carta porque seu ministério é guiado e sustentado por outra autoridade: o Espírito. De fato, desde seu encontro com Cristo, no caminho de Damasco, Paulo está sob o domínio do Espírito e não da Lei. Do mesmo modo, a autoridade, tanto da Igreja como da Ordem, não está escrita com tinta, mas com o Espírito de Deus vivo; não em tábuas de pedra, mas em tábuas de carne, isto é, em vossos corações (2Cor 3,3). Por isso, os dirigentes, tanto de uma como de outra instituição, não podem querer exercer seu ministério sustentados pela lei escrita ou humana porque não foi essa que os uniu e constituiu em Igreja ou Fraternidade. Sua comunhão com os Irmãos nasce, permanece e se fortalece pela graça do encontro com o mesmo Senhor que chamou tanto a uns como a outros e graças à contínua presença do mesmo Senhor, que lhes prometeu estar com eles até o fim dos tempos.


Francisco se afina muito com São Paulo. Tanto na conversão como na espiritualidade. Como Paulo, também Francisco teve de ser derrubado do cavalo do fascínio vertiginoso da glória deste mundo, da vanglória do próprio humano, alcançada pelos méritos de seus próprios esforços e pela observância da lei. Agora, ele aproveita o precioso ensinamento de Paulo acerca da superioridade do Espírito à lei para incutir nos Irmãos a atenção à verdadeira autoridade de sua vida de seguidores de Cristo: O Espírito do Senhor e seu santo modo de operar. Em outras palavras, quem acolhe a Boa Nova, verá brilhar nele a glória de Cristo e será transformado em sua imagem e semelhança pela ação do Espírito, pulsante nas palavras do Evangelho.


Na verdade, cada um de nós se constitui num livro, numa grande e sagrada legenda, para usar um termo clássico, que precisa ser lida, conhecida, amada e reescrita. Eis o conteúdo dessa exortação. Por isso, para que esse trabalho seja efetuado de modo apropriado e devido, evitando possíveis desvios e decadências, Francisco começa com a famosa advertência paulina: A letra mata, mas o espírito vivifica. Espírito, aqui significa a clarividência da luz, o fogo da afeição e da paixão que sempre guiou Cristo em sua Obra redentora, salvadora e santificadora.



2. O Espírito franciscano


Esse Espírito de Jesus, derramado no coração de cada crente (Cfr. Rm 5,5), adquire características próprias da pessoa que o recebe, acolhe e cultiva. Assim, com razão, podemos falar em espírito franciscano, jesuíta, beneditino, etc., uma vez que cada um dos fundadores dessas Ordens seguiu Jesus Cristo a partir de um encontro e de uma inspiração toda própria, muito pessoal, distinta e diferenciada. Há, portanto, diz Francisco, um sopro vital divino impregnando todos os atos, todos os momentos de nossa existência, de nossa história bem como todos os textos das nossas Fontes Franciscanas e que nós devemos seguir, se quisermos ser vivificados por ele e transformados nele.


Assim, como Francisco, Clara, e muitos outros frades e as próprias Fontes Franciscanas, também todos e cada um de nós somos obra, operação, ato, floração desse Espírito “franciscano”. Mas, para que ela aconteça em nós é necessário que estejamos sempre bem dispostos a ouvi-la, entende-la, captá-la adequadamente e operá-la com fidelidade. A Igreja, seguindo o Mestre, fala em “estar atentos aos sinais dos tempos” (Cfr. Lc 12,54-57), em docilidade do espírito, virtude reconhecida de modo todo especial no Papa São João XXIII, que sentiu, logo após assumir o Papado, a necessidade da Igreja de voltar às suas origens. Por isso, foi canonizado com essa significativa marca: O Papa da docilidade do Espírito.


Aqui está o que poderíamos chamar de condição básica ou anterior para que se possa seguir o espírito da divina letra: dispor-se, sempre de novo, para sentir e conhecer este sopro vital originário a partir do qual nasce, pulsa e floresce todo o nosso ser, nossa vocação e os textos franciscanos. Mas, não basta ter sido visitado uma vez. Como diz nosso Papa Francisco: Todos os cristãos, em qualquer lugar e situação que se encontrem, estão convidados a renovar hoje mesmo seu encontro pessoal com Jesus Cristo, ou, pelo menos, a tomar a decisão de se deixar encontrar por Ele, de procura-lo dia a dia, sem cessar (EG 3).


No começo do chamado tudo vem de graça, sem nenhum esforço ou merecimento nosso. Mas, depois, é preciso fazer-se merecedor de tal e tão grande graça porque ela - a graça - segue a lei e a dinâmica do amor que nada pode exigir senão e apenas que a esperemos, a acolhamos e a guardemos. Não é à toa que Francisco, logo após o encontro com o Crucificado de São Damião, ajoelhado, reze: Dá-me Senhor, senso e conhecimento... (OC)



3. Seguir o espírito franciscano é nascer sempre de novo


Seguir o espírito originário de nossa vocação franciscana, porém, não se faz como quem segue um chefe, um líder, um patrão, um superior ou como o motorista que segue a estrada com seus sinais de trânsito. Pois, o sopro vital, o espírito não é algo que está aqui ou acolá, já de modo predeterminado, posto ou fixo. Isso seria seguir a letra que mata. Já com o espírito é diferente. Ele é como o vento. Sopra onde e como quer e jamais se poderá saber de onde vem e nem para onde vai; seguir o espírito se faz como quem segue um amigo, a pessoa amada. Aqui não existem receitas ou meios prontos que nos garantam o seguimento porque, nesse caso, o princípio é o mistério da graça do Encontro, da entrega confiante, livre e gratuita, mas necessária, sem porquê nem para quê.


Francisco pede que sigamos o espírito. Nós, então, logo queremos saber e perguntamos “como”? Ora, espírito, como amor, pertence ao rol de realidades que só se compreendem e se conhecem de modo direto e imediato, isto é, sem mediações, num envolvimento corpo a corpo com a graça do chamado. Ou seja, o conhecimento da realidade chamada espírito originário franciscano, não carece de primeiro saber o “como” para compreendê-lo, mas, sim, que vai se conhecendo-o, saboreando-o pelo contato direto, corpo a corpo, mediante a história vocacional de cada um e da Ordem franciscana. Por isso, os antigos compreendiam esse processo como um novo nascimento. Daí nasceu a nossa palavra conhecimento. Nesse processo, todo conhecimento é um novo nascimento e vice-versa, todo nascimento é um novo conhecimento. Nesse sentido, conhecimento, antes de um conjunto de dados, conteúdos ou informações, era entendido como processo que nos faz conascer sempre de novo naquilo, naquele ou com aquilo, com aquele que procuramos. Quando isso acontece, diz o profeta Sofonias: Ele, o Senhor, exulta de alegria por tua causa e pelo seu amor te renovará. Ele dança e grita de alegria por tua causa (Sf 3,17).


Agora, não fica difícil compreender os exemplos ou situações elencadas por Francisco para mostrar quando ou como somos ou vivemos mortos pela letra. Assim, cobiçar saber só as palavras, etc., indica aquele modo de ser tão criticado pelo Senhor no Evangelho e que refulge na mente e nas atitudes dos fariseus que rezavam nas esquinas e nas sinagogas em pé, só para serem vistos pelos outros (Cfr. Mt 6,6). Ora, para o seguimento de Cristo, como, também para o casamento, há apenas um pecado, e esse é mortífero: substituir o senhor, o amigo, a/o esposo/a pelo próprio eu. Nesses casos, em vez da alegria da gratuidade do encontro, do chamado, prefere-se viver na estreiteza e no amargor do curto-circuito do próprio eu. Por vezes, essas pessoas, aparentam-se muito “alegres”, “ativas” e “dispostas”, mas são de fôlego curto. Por qualquer adversidade que venha a ofender lhes o próprio eu, logo se escandalizam e perturbam (Cf. Ad. 14). São como árvores que quiseram crescer com as raízes expostas ao público a fim de serem vistas, admiradas, aplaudidas. Anestesiadas pelo embalo do engrandecimento da própria subjetividade nem se apercebem que, cristãmente ou franciscanamente, já estão mortas, mesmo antes da morte chegar.



4. Não atribuem a si toda a letra que sabem e cobiçam saber


As duas últimas frases soam como um alerta final para que em todo o percurso de nossa vida não esqueçamos jamais de sermos agradecidos e gratuitos. Pois, se formos um pouco atentos à nossa história, aos nossos empreendimentos e ações, haveremos de perceber com bastante clareza como e quanto nossa subjetividade gosta de adonar-se dos benefícios que nos são concedidos a toda hora; como ela gosta de entrar sorrateiramente em termos de auto-imagem, auto estima, auto formação, auto realização e roubar o bem que não lhe pertence. No fundo o fariseu somos nós que a toda hora dizemos: “Eu fiz isso, eu fiz aquilo, ajudei aquele pobre, visitei aquele doente, consolei aquele desanimado, fiz aquela oração!”, etc. E assim, o balão da vanglória logo logo estufa o peito e os pulmões do nosso ego. Mas, também, logo logo, por qualquer contrariedade, implodirá e murchará. É, como nos alerta nosso Papa: Pode acontecer que o coração se canse de lutar, porque, em última análise, se busca a si mesmo num carreirismo sedento de reconhecimentos, aplausos, prêmios, promoções (EG 277). Francisco nos diria: “Você está esquecendo a verdade mais fundamental de você mesmo. Você, por você mesmo, é nada, não é capaz de nada. Não passa de uma simples, pobre e miserável criatura. Se algo de bom saiu de seu coração e aconteceu pelo seu trabalho é porque nasceu do altíssimo Senhor Deus, de quem é todo o bem. Enfim, não esqueça que alguém o amou por primeiro”.


Mas, de novo, seria contra a natureza e a dinâmica do amor alguém, como no casamento ou na amizade, por exemplo, proclamar-se a causa do bem. Pelo contrário, se algo de bom aconteceu será sempre do outro. E, pelo contrário, se algo de mau ou errado acontecer o culpado serei sempre eu. É o que, desde o pecado de Adão, Deus fez e vem fazendo através de seu Filho Jesus Cristo. Toda História Sagrada não passa de um permanente testemunho do quanto Deus põe e guarda em seu coração nossas maldades como sendo suas. É assim que Ele nos liberta da tristeza e da prisão de nossos pecados para que possamos viver no júbilo do filho pródigo que foi acolhido pelo Pai na intimidade de sua casa.


Esse é o Bom Pastor que se apresenta junto ao Pai como o humilde e manso cordeiro que carrega o pecado do mundo, que declara ao Pai que nossas infidelidades e maldades são sempre Dele e não nossas. Quando se ama, tudo o que tenho de bom vem da pessoa amada e, ao contrário, tudo o que eu ou ela temos de ruim a causa, o culpado sempre serei eu. A mesma experiência se dá também no fazer. Por mais e melhores bens que eu faça à pessoa amada, jamais direi que lhe fiz bem, mas, ao contrário, sempre lhe pedirei mil e uma desculpas porque não a servi como deveria. Deveríamos, pois estar bem atentos ao ensinamento do Mestre: Assim também vós, quando tiverem feito tudo o que vos for ordenado, devem dizer: ‘Somos servos inúteis; apenas cumprimos nosso dever (Lc 17,10). E o contrário, sim, é verdadeiro: tudo o que vem do outro é bom e perfeito, seja o que for, como o testemunha Cristo em relação ao Pai na Cruz.



Vivificados pelo Espírito, hoje


Belo exemplo de alguém que não atribui a si nenhum bem é Francisco que costumava dizer, sempre: meu Deus e tudo (Atos 1). Da mesma forma foi Maria. Em seu Magnificat, nem ousa dizer Eu”, mas a minha alma engrandece o Senhor. É como se quisesse dizer: minha vida, com todos os meus dons, se movimenta no amor de Deus, em louvor e grande alegria. Deixo de ser dona de mim mesma. Antes, sou engrandecida do que exalto a mim mesma para o louvor de Deus. Isso acontece a todos os que são invadidos pela doçura de Deus e por seu Espírito, assim que sentem mais do que conseguem expressar. Pois louvar a Deus não é obra humana. Antes é um sofrer alegre a obra exclusiva de Deus, que não se pode ensinar com palavras, mas conhecer somente através da experiência própria (Magnificat, o louvor de Maria, Martin Lutero, Santuário, Sinodal, pág. 27).


Por tudo isso, Franciso conclui: Mas, pela palavra e pelo exemplo devolvem-na ao altíssimo Senhor. Pela palavra significa pelo pensamento, pela meditação, oração e contemplação. Pelo exemplo significa pelo desejo, pela afeição, empenho e ação. Diz nosso Papa Francisco: Jesus quer evangelizadores que anunciem a Boa Nova, não só com palavras, mas sobretudo com uma vida transfigurada pela presença de Deus (EG 259). E, mais adiante, continua e explica: Evangelizadores com espírito quer dizer evangelizadores que rezam e trabalham. Do ponto de vista da evangelização, não servem as propostas místicas desprovidas de um vigoroso compromisso social e missionário, nem os discursos e ações sociais e pastorais sem uma espiritualidade que transforme o coração. [...] Ao mesmo tempo, «há que rejeitar a tentação duma espiritualidade intimista e individualista, que dificilmente se coaduna com as exigências da caridade, com a lógica da encarnação». Há o risco de que alguns momentos de oração se tornem uma desculpa para evitar de dedicar a vida à missão, porque a privatização do estilo de vida pode levar os cristãos a refugiarem-se nalguma falsa espiritualidade (EG 262).



Para pensar e compartilhar:


1. Qual a semelhança entre São Francisco e São Paulo?

2. O que significa ser vivificado pelo Espírito?


Paz e Bem!

Fraternalmente,


Frei Dorvalino Fassini, OFM e Marcos Aurélio Fernandes




Continue bebendo do espírito deste tema:


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